Balbina e Volkswagen: dinheiro do povo destruindo a floresta

Segundo Arthur, a construção dessa usina causou uma perda inominável para a natureza e o futuro de nossa gente

Manaus – Meu primeiro discurso como deputado federal foi sobre a questão ambiental. Afinal, naquele período autoritário as decisões eram quase sempre tomadas de cima para baixo. Foi o caso, por exemplo, da hidrelétrica de Balbina, no nosso Amazonas.

Nesse caso, os tecnocratas de Brasília, amparados na força dos que nos governavam sem a consagração do voto popular, decidiam sem conhecimento prático de causa e o resultado foi funesto: no primeiro dia de funcionamento da usina constatou-se que ela começava sua trajetória já insuficiente para atender 100% da demanda de Manaus. E a construção dessa usina deficiente custou a destruição de muitas e muitas árvores, o “afogamento” de pedras preciosas, uma perda inominável, enfim, para a natureza e o futuro de nossa gente.

A leitora, ou o leitor, deve estar se indagando se a hidrelétrica era, afinal, necessária. Respondo que sim, emendando com uma pergunta também: Ali era o local? Seria necessária tanta devastação e tanta submersão de pedras preciosas? Outro questionamento: Teria sido correto escreverem e seguirem o “manual” da construção à risca, sem levar em conta que a obra já nasceria insuficiente? Que populações seriam prejudicadas? Que não era inteligente desprezar a inteligência e experiência de engenheiros e outros profissionais do Amazonas e da Amazônia?

Balbina nasceu em meio a tantos desastres, a ponto de eu poder selecionar aqui algo bom, que nasceu do caos que estava posto. Invadiram terras dos waimiri e dos atroari, duas etnias indígenas que nos levam a uma cultura bastante relevante. Pois bem, amigo leitor, amiga leitora, os waimiri e os atroari eram inimigos figadais. A destruição em torno de uma hidrelétrica insuficiente levou as duas etnias a se unirem para enfrentar o inimigo comum. Aquele inimigo que, dos gabinetes confortáveis de Brasília, tomava decisões insensatas, sem sequer consultar os seres humanos que poderiam ser prejudicados. Sem levar em conta riquezas que poderiam ser desperdiçadas. Vinha tudo goela abaixo dos brasileiros e brasileiras. Por isso, cultuo tanto a democracia. Como dizia Churchill, democracia é um sistema político com muitos defeitos, porém, infinitamente melhor que todos os demais modelos. Principalmente as ditaduras.

Volto agora ao meu discurso de estreia na Câmara dos Deputados. A ideia era reforçar as gravíssimas denúncias do esbulho praticado pela gigante Volkswagen, em conluio com a infeliz e malfadada Sudene da época. Esta, amparada numa lei absurda, permitia abatimentos “generosos” no imposto de renda de empresas que implantassem fazendas de gado no sul do Pará. A Volkswagen, então, provocou imenso incêndio na floresta, beneficiou-se dos incentivos fiscais e jamais promoveu qualquer atividade econômica no local. Ganhou dinheiro para desertificar um pedaço da Amazônia. E hoje, enquanto a Zona Franca garante 95% de floresta original para o Amazonas, o Estado do Pará conta com menos de 40%.

O discurso foi agitado. Apartes e mais apartes vindos do governo e dos meus companheiros oposicionistas. Discussões paralelas. Troca de empurrões e, de minha parte, duras críticas ao regime autoritário. Ampla cobertura da imprensa, dos telejornais, das rádios de todo o país. E estava plantada a semente do parlamentar ativo e altivo que tentei ser enquanto lá estive.

Cuidava dos temas nacionais, mas não esquecia a minha terra. A defesa do Polo Industrial de Manaus era ponto essencial na minha trajetória e do meio ambiente também. Minha meta era transformar a Amazônia e o Amazonas em temas nacionais e não mais paroquiais. Em temas nacionais e internacionais igualmente. Hoje, percebe-se que a intuição do jovem parlamentar não se distanciava do realismo, da realidade. Pois está aí mesmo a inegável condição de região mais importante para o Brasil e para o mundo. Só não vê quem se obstina a não enxergar fatos concretos e irreversíveis, como a Amazônia, ‘terra brasilis’ e de profunda relevância planetária.

Feliz domingo para a família amazonense!

Amazônia – maior banco genético do mundo

Para Arthur Virgílio Neto, o desmatamento ilegal na Amazônia é crime imperdoável contra a vida, contra o futuro, contra, inclusive, a soberania nacional

Inicio falando um pouco de Amazônia e, sem dúvida, da principal instituição que a compõe: o Estado do Amazonas.
Aqui conseguimos manter, mesmo em tempo de pandemia e crise econômica, cerca de 95% da cobertura florestal original, contra menos de 40% no Pará, o segundo maior ente da federação brasileira. Claro que não desconheço a relevância dos demais Estados da região e nem deixo de me interessar pelo que se passa nos Estados amazônicos do subcontinente sul-americano. Cada árvore preservada importa muito. Eis porque lamento o quadro assustadoramente perigoso e crescente do desmatamento ilegal. É crime imperdoável contra a vida, contra o futuro, contra, inclusive, a soberania nacional sobre a parte tão nobre da parte que lhe cabe na Amazônia.

Alguém pode indagar: “Arthur, você é contra o agronegócio?”. Resposta rápida e clara: claro que sou a favor, mas nos locais propícios para essa atividade tão relevante na geração de empregos e renda, bem como para os resultados positivos de nossa balança comercial. Penso ter esclarecido que sou apoiador e admirador do agronegócio. Competitivo a ponto de incomodar países como França e EUA, além de ser uma das principais pautas dos debates e conflitos na rotina da Organização Mundial do Comércio, a relevante OMC.

Posso, então, afirmar que seria insano permitirmos o agronegócio no coração da Amazônia. A pata do boi, a soja e outros produtos de valor e excelente aceitação nos mercados internacionais. Afinal, é inquestionável que essas atividades renderiam frutos por duas ou três décadas… e desertificariam a grande floresta, minguando os rios grandiosos, mexendo negativamente com o clima mundial e expondo o Brasil, até mesmo, a uma intervenção militar, sob a égide da ONU.

O que deve ser trabalhado pelos amazônidas é a exploração, amparada nos órgãos científicos como o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), Museu Emílio Goeldi, universidades e o binômio cientistas formais e cientistas empíricos. Os formais – os estudiosos e PHDs – são imprescindíveis. Os empíricos – índios e populações tradicionais – idem. Juntos, eles são a chave para o crescimento sustentável desta região e deste país. Isso porque os índios ou ribeirinhos conhecem, como ninguém, a floresta e seus segredos, sabem como entrar e sair da mata em segurança; enquanto os PHDs têm o conhecimento necessário para criar os fármacos, por exemplo, as fragrâncias e uma infinidade de produtos a partir da biotecnologia.

No próximo artigo, prosseguirei a partir deste ponto. E iremos longe, no debate e na luta, cheia de razões, para fazermos do maior banco genético do mundo um instrumento de enriquecimento do Brasil, da Amazônia, dos brasileiros e dos amazônidas.

*Diplomata, foi deputado federal, senador, líder por duas vezes do governo Fernando Henrique Cardoso, ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, líder das oposições no Senado ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e três vezes prefeito da capital da Amazônia – Manaus

Para quem sonha escuridão, luzes de liberdade

Segundo ex-prefeito Arthur Virgílio, “o presidente da República, Jair Bolsonaro, visivelmente apostava em atrair as Forças Armadas para uma aventura autoritária e, obviamente, destinada ao fracasso”

Manaus – A democracia brasileira, que enrijece suas instituições cada vez mais, saiu vitoriosa no recentíssimo episódio que ainda vai desenrolando seus últimos momentos. O presidente da República, Jair Bolsonaro, visivelmente apostava em atrair as Forças Armadas para uma aventura autoritária e, obviamente, destinada ao fracasso.

Isso teria um custo político elevado para o Brasil e para um povo generoso, que deseja o fim da pandemia de Covid-19 e o retorno dos empregos, do crescimento econômico sustentável e mais e mais direitos e liberdade de ir e vir e de expor o que pensa e sente, até porque sabe que o Brasil é grande e significativo, jamais minúsculo e inexpressivo.

Há quem negue os valores democráticos, e o presidente Bolsonaro é exemplo disso, mas a maioria tem ciência de que autoritarismo é sinônimo de atraso econômico, cerceamento à cidadania, comprometimento do meio ambiente, opressão às vozes discordantes e trevas intelectuais, ao invés de criação e luzes

Bolsonaro pretendia obter a edição de medidas excepcionais para limitar, à força, a revolta brasileira com o boicote presidencial à luta, que deveria ser de todos, contra a pandemia e a favor da vacinação, urgente e em massa, de todos os brasileiros. Afinal, “sem saúde não há economia”, como disse – sabiamente – o ministro da Economia, Paulo Guedes.

Nessa luta entre os militares que saíram e o caudilho que ficou, venceram os que se foram, resguardando suas biografias e mostrando ao Brasil que aqui não existe mais espaço para golpes e aventuras e aventureiros típicos de repúblicas bananeiras.

Ao invés de nomes como Rafael Trujillo, da República Dominicana; François e Jean-Claude Duvalier e seus tontons macoûtes, do Haiti; Marcos Pérez Jimenez e o início da tragédia venezuelana; nós aqui somos Juscelino Kubitscheck, Fernando Henrique, Joaquim Nabuco, Mario Covas e outros ícones da democracia brasileira.

Ditadura nunca mais! Os generais Fernando Azevedo e Silva e Edson Leal Pujol, o almirante Ilques Barbosa Junior, o brigadeiro Antônio Carlos Moretti Bermudez e seus camaradas acabaram de dar essa lição cidadã ao arrivista que sonhava com a escuridão, mas terá de se conformar com as luzes brilhantes da liberdade.