Mais uma vez o Amazonas sai prejudicado pela visão turva de tecnocratas que se opõem ao modelo econômico que mantém a floresta em pé

Trago hoje uma discussão que se entende há décadas em torno da reconstrução da BR-319. Minha posição é simples e uma só: esse é um direito do povo do Amazonas, que absurdamente vive isolado do resto país, por via terrestre, em pleno século 21. Antes mesmo de falar sobre as tão necessárias questões ambientais, é preciso fazer prevalecer o direito constitucional de ir e vir dos amazonenses. A rodovia liga Manaus à Porto Velho e, consequentemente, o Amazonas com o restante do Brasil.

Inaugurada em 1976, a BR-319 chegou a ser fechada, em 1988, por falta de manutenção. De lá pra cá, são anos e anos, governos após governos, de impasses sobre a manutenção da rodovia, que também é fundamental para escoar a produção do Polo Industrial de Manaus (PIM), mantendo a competitividade da Zona Franca de Manaus (ZFM). E, aqui, acho que chegamos ao cerne da questão: mais uma vez o Amazonas sai prejudicado pela visão turva de tecnocratas que se opõem ao modelo econômico que mantém a floresta em pé.

Nesta última semana, vimos mais um embaraço dispensável sobre o tema. O Ministério Público Federal no Amazonas (MPF-AM) recomendou que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama) não realize as audiências públicas, presenciais e/ou virtuais, para expor o conteúdo do Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), uma das etapas obrigatórias para o licenciamento ambiental do chamado ‘trecho do meio’ da rodovia BR-319. Com 885 quilômetros de extensão, o miolo da estrada – que vai do quilômetro 250 ao 655 – perdeu completamente o asfalto, tornando-se um atoleiro e com muitas crateras.

Agora, vamos falar de meio ambiente, mas falar de verdade e não usar a preservação da floresta como desculpa para impedir o desenvolvimento da região mais estratégica deste país. A Amazônia que se estende pelo território amazonense tem hoje 95% de sua cobertura florestal preservada, isso se deve à Zona Franca de Manaus, modelo industrial livre de chaminés, que não polui e o principal responsável por impedir o avanço da população sobre a floresta.

Para mim, a lógica é simples: a Amazônia vem sendo devastada, mas não pela BR-319. O que falta são compromissos sérios com política ambiental, com as mudanças climáticas, o que falta é respeito aos povos tradicionais indígenas, falta crença na ciência e nas possibilidades muitas de economia verde, a partir da biodiversidade, com as árvores em pé. E nisso, falo com convicção, a BR-319 se tornaria até aliada, porque seria um grande incentivo ao Polo Industrial de Manaus, ao modelo econômico que por anos mantém a floresta amazônica amazonense preservada.

E quando se fala de Amazônia, de Zona Franca de Manaus, é preciso ir até além da necessidade da BR-319. O Amazonas vive isolamento terrestre, mas também não tem internet e telefonia celular de qualidade. Também é urgente investimento em formação de capital intelectual e em mão de obra, assim como na criação novos polos, como o de drones, para enfrentarmos a obsolescência de alguns segmentos industriais do nosso PIM.

*Diplomata, é diretor do Núcleo de Educação Política e Renovação do CPJUR – Centro Preparatório Jurídico, foi deputado federal e senador, líder por duas vezes do governo Fernando Henrique, Conselheiro da Presidência da República, ministro-Chefe da Secretaria-Geral da Presidência, líder das oposições no Senado por oito anos seguidos, três vezes prefeito da capital da Amazônia.

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